30 de outubro de 2007

O último perfume do Rei Narigão

Epílogo

Soaram as trompas pelo reino, anunciando o torneio. Foi comunicado que tomaria a mão da Princesa Hortênsia o súbdito que desse a saborear ao Rei um odor que lhe fosse totalmente novo. Teriam os pretendentes duas semanas para obter esse perfume desconhecido.

Sabendo dos dotes do rei malvado, compareceram ao torneio apenas três candidatos.

O primeiro usava o nome de Cavaleiro Ardente. Era forte e audaz mas bruto como as casas.

O segundo, de sua graça João Sabichão, era astuto e estudioso, um rato de biblioteca, e feio como uma raposa velha.

O terceiro era formoso, bem disposto e bom compincha, ainda que os seus amigos lhe apontassem o defeito da preguiça. Chamava-se Margarido e Hortênsia estava por ele caída de amores.

O Cavaleiro Ardente pegou no seu cavalo reluzente e zarpou a toda a brida para o Reino das Trevas.

João Sabichão, mal o Rei lançou o repto, sorriu e voltou, plácido, para a biblioteca.

Já Margarido voltou para o seu quarto, onde durante duas semanas não fez melhor do que ouvir música no seu I-Pod, jogar ao Fifa 2008 na PlayStation e namorar com Hortênsia no Messenger.

As duas semanas passaram num ápice e os três pretendentes compareceram perante o Rei.

O Cavaleiro Ardente tinha os cabelos desgrenhados, a face suja e manchada de sangue seco e apresentava queimaduras pelo corpo. Carregava consigo uma geleira, daquelas de piquenique.

Já o João Sabichão trazia na mão direita um copo de cristal, contendo um líquido transparente.

Por sua vez, Margarido apresentou-se, singelo, com a sua velha adaga, enegrecida e corroída pela ferrugem.

O Rei Narigão aproximou-se e o Cavaleiro Ardente abriu a geleira:
“Trago-te o coração de um dragão alado. Apesar de ser um músculo, dizem as lendas que não cheira a carne, mas a enxofre!”
“Pode ser, Cavaleiro Ardente, mas para isso terias que ter posto gelo na tua geleira, grande burro. Isto cheira-me a carne podre. Para o fosso dos jacarés” – e foi para onde a Guarda Real o lançou.

Veio então o João Sabichão. Mostrando ao Rei o copo de cristal, disse-lhe:
“Trago-te as lágrimas de uma viúva recolhidas no funeral. Cheiram a piedade e a desgosto. Aposto que são fragrâncias que desconheces, meu Rei”.
“São lágrimas de crocodilo, isso sim. Foi a viúva que matou o marido, para viver com o amante. Sei-o pelo cheiro, tresanda a luxúria e traição. Para o fosso!”. E a Guarda Real deu mais comida aos jacarés.

Restava apenas Margarido. Aproximando-se do Rei, pediu que este cheirasse o seu velho punhal. Não sentindo outra coisa que não o cheiro a metal enferrujado, Margarido insistiu para que Rei que se aproximasse ainda mais.

Apanhando-o desprevenido, Margarido desenhou com o traço da velha mas afiada lâmina um corte preciso e cirúrgico no pescoço do Rei. Jorrava sangue da jugular.

A Guarda Real pegou em Margarido e já o levava para fora do castelo, preparando-se para lançá-lo aos jacarés, quando o Rei, num último estertor, e fazendo um sorriso de prazer, exclamou:

“Esperem, não o levem. Margarido venceu. Sinto um perfume novo.




É o perfume da minha Morte!”

Margarido desposou Hortênsia, foi coroado como Rei Margarido e viveram felizes para sempre.

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