14 de junho de 2009

Máxima

(foto copyright by rita andorinho)


(c0nt.)


Máxima, na busca juvenil pelo detalhe, pelo concreto, queria ir mais longe, perguntar-lhe o que isso queria dizer, de se agarrar os sonhos com muita força, de se partir os sonhos se os agarrasse, mas a Velha não lhe fez caso, e começou uma reza, que jamais seria interrompida - a pequena Máxima, apesar da meninice, bem sabia que a Velha, por muito que não aparentasse, era uma mulher, e que as mulheres feitas também têm dúvidas e inseguranças, e que às vezes as mulheres graúdas têm de ser mimadas e apaziguadas como as crianças que estão por saber o porvir de ser mulher, e, nesse jogo de troca, a pequena Máxima mimava a Velha, sempre que ela se refugiava em preces, com historietas fantásticas saídas do nada. A Velha ouvia como a pequena Máxima – aflita com o negro recolher – flutuaria impune pelos ares sempre que eles parecessem pardos e revoltos e espessos de solidão e, armada com um espanador mágico, faria em pó as nuvens plúmbeas e vestir-se-ia do brilho do sol, reluzindo os calores contentes como diamantes diáfanos e seriam tão numerosos esses pingentes que os partilharia com a Velha e nunca mais ela seria: triste. A Velha sorria, com uma alegria indulgente, dessas tontices juvenis, mas o seu sorriso colidia sempre com o olhar. Sim, a sua boca desenharia um sorriso envergonhado, as suas bochechas erguer-se-iam com um esforço que parecia, à pequena Máxima, sobre-humano, mas os seus olhos nunca se juntavam à festa. Despojados, impenetráveis. Era claro, para a pequena Máxima, sem contudo ainda o saber, que era um sorriso de favor, um aceno de reconhecimento, uma reminiscência de uma vida que outrora parecia inflamada de expectativa e que parecia renascer com os sonhos da pequena Máxima, mas logo o olhar da Velha delatava, era para Máxima límpido, sem contudo saber bem porquê, o vazio, ou a sabedoria, ou o desencantamento (a verdade dos factores seria, ainda o não sabia bem, arbitrária). E, de sorriso apesar de tudo ainda posto, a Velha retomava o fio à meada e continuava na sua ladainha, no diálogo com o Todo-Poderoso, que os olhos vítreos indiciavam não passar de um monólogo. Dessa vez não foi diferente, e à sofreguidão da pequena Máxima, a Velha retorquiu, com o (des)encanto adulto pelo abstracto, pelo ambíguo: há-de chegar o momento em que perceberás como os sonhos se partem, se os agarrares com força. E em que saberás se és tu que sonhas, se é o teu avesso. Porque nunca somos um só. E nesse momento, por sua vez, os teus filhos terão o direito de tratar por: Velha.


E foi nesse preciso momento, em que, num quarto de um hotel, umas mãos carregadas a abanavam de modo a que ela própria, Máxima, por sua vez retomasse o fio à meada, que esta se deu conta que havia chegado o momento em que os seus filhos (se os houvesse) a poderiam, por sua vez, tratar por: Velha.


(cont.)

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